No primeiro round das lembranças, o tempo volta para 1974. No dia 30 de outubro, o Zaire estava em turbulência, no bom sentido. Aos 32 anos, o maior pugilista de todos os tempos, Muhammad Ali, que nesta terça-feira completa 70, entrava no ringue de Kinshasa para enfrentar o então campeão George Foreman aos gritos de "Ali, bu maye!". A frase, que pediu aos africanos para cantar, queria dizer "Ali, mate-o!". Era parte do plano para tentar recuperar o cinturão dos pesos-pesados perdido desde que se recusou a lutar no Vietnã. Há anos já convertido ao islamismo - abriu mão do nome de batismo, Cassius Marcellus Clay Jr. - e ativo na luta pelos direitos civis dos negros - chegou a se aliar ao líder Malcolm-X -, Ali, apesar do apoio da população, era dominado pelo adversário. Mais jovem e mais brutal, o rival batia com a mesma força com que deixava buracos nos sacos de areia que usava para treino.
Mas Ali aguentou firme. A cada soco que levava, encurralado nas cordas, provocava o rival. E Foreman cansou. A tática deu certo. No oitavo assalto, o anti-herói americano aumentou a aura de mito que já carregava. Desferiu o golpe final com a maestria dos grandes. "Quando éramos reis", documentário lançado em 1996 sobre a luta, mostra uma cena clássica: a imagem dos jornalistas americanos Norman Mailer e George Plimpton de boca aberta com o feito do dono da coroa de seu tempo.Também no Zaire, o único repórter brasileiro presente à luta vivia o seu momento de glória. Newton Campos, 86 anos, não consegue esquecer a cobertura mais marcante de sua carreira. No Brasil, outro jornalista, que já tinha entrevistado o pugilista em 1970, em Nova York, se emocionava com a façanha. Sérgio Leitão, hoje com 65 anos, é tão fã do lutador que batizou de Cassius um de seus filhos.
Os ídolos americanos batem palmas para Ali. Os brasileiros também. O pugilista Éder Jofre, bicampeão mundial no peso-galo e no peso-pena, glória nacional, de quem Ali foi admirador, e o lutador supercampeão Anderson Silva, do MMA, febre do momento que ocupa um espaço já do boxe tempos atrás, se rendem também à técnica e à liderança do maior de todos os tempos.
- Acho que o Ali é o rei do boxe e a referência pública negra no esporte. Depois dele vieram Michael Jordan, Magic Johnson e tantos outros. Ele abriu as portas para todos nós. E tinha uma garra e um estilo inconfundíveis, que me inspiram. A luta do século, contra Foreman, é uma aula de superação. Além disso, era ambicioso e um visionário - afirmou por e-mail Anderson Silva, dono do cinturão do pesos-médios e considerado hoje o maior lutador do MMA.
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